A Teoria da Escolha Pública, desenvolvida por renomados economistas como James Buchanan e Gordon Tullock, lança uma luz reveladora sobre a dinâmica política e econômica que permeia a gestão pública. Ao aplicar princípios econômicos para analisar o comportamento dos agentes públicos, essa teoria expõe uma realidade preocupante: políticos e burocratas, muitas vezes, agem em prol de seus próprios interesses, em detrimento do bem-estar coletivo. Essa constatação se torna ainda mais evidente quando observamos o crescente volume de precatórios não pagos nos municípios e estados brasileiros.

Os conceitos fundamentais da Teoria da Escolha Pública nos ajudam a compreender as raízes desse problema. O interesse próprio, a racionalidade limitada, os ciclos políticos e a captura reguladora são fatores que influenciam diretamente as decisões dos gestores públicos. Um prefeito, por exemplo, pode optar por investir em obras visíveis, como praças e estradas, visando um retorno eleitoral imediato, em vez de priorizar o pagamento de precatórios, que são menos perceptíveis para o eleitorado. Essa lógica perversa perpetua um ciclo vicioso de endividamento e descaso com as obrigações financeiras do Estado.

Os números não mentem. Segundo dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o montante de precatórios não pagos pelos municípios em 31/12/2023 é de R$ 58.605.130.506,93 e dos Estados é de R$ 108.691.251.743,75, um passivo que compromete seriamente a saúde financeira dos entes federativos e apresenta um crescimento de 13,51% em relação a 2022. Essa tendência preocupante de crescimento contínuo revela uma gestão fiscal inadequada e a falta de prioridade dada a essas dívidas. É um reflexo claro das falhas apontadas pela Teoria da Escolha Pública.

Os gestores públicos enfrentam um dilema moral: alocar recursos para projetos que geram visibilidade e votos ou honrar os compromissos financeiros com os precatórios. Infelizmente, a busca pela reeleição e a falta de transparência nos processos orçamentários acabam favorecendo a primeira opção. Essa escolha míope tem consequências nefastas a longo prazo, comprometendo a credibilidade e a sustentabilidade das finanças públicas.

Diante desse cenário desolador, é imperativo adotar medidas contundentes para enfrentar a crise dos precatórios. A transparência e a responsabilização dos gestores públicos são pilares fundamentais nesse processo. Ferramentas como portais de acesso a informações financeiras e auditorias independentes podem jogar luz sobre as decisões tomadas e expor eventuais desvios de conduta. Reformas institucionais que limitem o poder discricionário dos políticos e burocratas também são essenciais para reduzir a influência de interesses particulares e melhorar a gestão fiscal.

Mas não basta apenas cobrar dos governantes. A sociedade civil também tem um papel crucial nessa luta. A educação cívica e a participação ativa dos cidadãos são armas poderosas para pressionar os governantes a cumprirem suas obrigações financeiras. Campanhas de conscientização e programas educativos podem empoderar a população a exigir maior responsabilidade fiscal e transparência na gestão dos recursos públicos.

Além disso, é fundamental implementar políticas de planejamento de longo prazo que considerem o impacto futuro das decisões atuais. A criação de fundos de reserva e a adoção de práticas de gestão financeira prudente são medidas que podem evitar a acumulação desenfreada de dívidas como os precatórios.

A Teoria da Escolha Pública nos oferece uma lente crítica para compreender a crise dos precatórios que assola os municípios e estados brasileiros. Ao desnudar os incentivos perversos e as limitações que moldam o comportamento dos agentes públicos, essa teoria nos alerta para a necessidade de uma mudança profunda na forma como a gestão pública é conduzida. A solução passa por uma abordagem multifacetada, que envolve transparência, reformas institucionais, participação cívica e planejamento de longo prazo.

Não podemos mais aceitar a perpetuação dessa lógica perversa que privilegia interesses particulares em detrimento do bem-estar coletivo. A crise dos precatórios é um sintoma de problemas estruturais na governança e na gestão fiscal, que exigem uma resposta firme e imediata. Somente com uma mobilização ampla da sociedade e com a adoção de medidas contundentes poderemos superar esse desafio e construir um futuro mais justo e sustentável para todos os brasileiros.